
O romance Assassinato na Floresta, de Paulo Rangel, é uma paráfrase da história de Chico Mendes, líder seringueiro, assassinado em 1988, pelos mesmos motivos por que Raimunda, personagem da narrativa, também foi eliminada. Ambos eram líderes seringueiros e deram suas vidas em defesa dos povos da região amazônica e da natureza exuberante e fundamental para a vida humana. Esse fato confere ao romance um caráter épico, que, somado ao aspecto policial que a narrativa encerra, coloca o livro de Paulo Rangel num lugar de destaque em sua categoria de Literatura juvenil.
Do ponto de vista estrutural a narrativa assemelha-se ao chamado romance-reportagem, cujas características essenciais são o seu caráter histórico-jornalístico, além do tom de reportagem policial que ela encerra. Os fatos são distribuídos através de quarenta capítulos narrativos acompanhando toda a trajetória do repórter policial Ivo Cotoxó que tenta desvendar as circunstâncias que envolveram a morte da líder seringalista Raimunda, no interior do Amazonas. O trabalho que deveria obrigatoriamente ser feito pela polícia acaba sendo realizado pelo jornalista, inclusive, e, talvez, com mais competência. O romance torna-se, pois, um exemplo do que se chama hoje jornalismo investigativo.
Embora o romance faça inúmeras referências ao assassinato de Chico Mendes, percebe-se que a história de Raimunda assemelha-se à do líder de Xapuri, o que caracteriza a narrativa de Paulo Rangel como uma paráfrase. Mas, inegavelmente, Assassinato na Floresta, com seus ingredientes literários, portanto, ficcionais, permite ao leitor penetrar em nuances que não ficaram devidamente esclarecidas, porque não aprofundadas, pelas autoridades brasileiras, no caso da eliminação de Chico Mendes. Ao contrário, no romance, a perspicácia de Ivo Cotoxó leva-o a destrinchar todo o emaranhado do episódio, o que permitiu a descoberta de todos os envolvidos no assassinato, desde a ponta do “iceberg” até a sua essência. É como se houvesse uma insinuação por parte de Paulo Rangel de que a morte de Chico Mendes foi esclarecida apenas pelos aspectos mais imediatos, ou seja, descoberta e punição dos mandantes e criminosos mais perceptíveis, colocando-se, de lado, aspectos políticos e econômicos que envolveram, também, a morte do líder acreano.
A investigação do repórter da Tribuna da Pátria estimula o leitor brasileiro a entender a realidade vivida pelos povos da Amazônia, e, nesses termos, observa-se que ao extrapolar o fato meramente policialesco do assassinato de Raimunda, Cotoxó coloca o leitor numa posição privilegiada do ponto vista histórico-político, ao revelar que a simples morte de uma seringueira, no interior do Brasil, estava relacionada, como decerto a de Chico Mendes, com a política econômica internacional de exploração das regiões mais pobres da terra pelas grandes potências, mas ao mesmo tempo ricas do ponto vista da natureza. É exatamente essa riqueza que é ambicionada pelos países mais industrializados e mais ricos, que, ao mesmo tempo em que se arvoram como defensores da natureza, agem sorrateiramente, como predadores, e, para tanto, usam seus cidadãos e as multinacionais para colocar em prática interesses escusos.
Esse é o grande mérito da reportagem de Ivo Cotoxó e, por conseguinte, do romance de Paulo Rangel que estimula o leitor a aprofundar essa linha de raciocínio através de outras publicações, tanto literárias, quanto jornalísticas e cinematográficas. Portanto, faz-se mister que o leitor se informe sobre a Amazônia e circunstâncias da vida e morte de Chico Mendes.
Professor, mais uma vez estou aqui para dar o meu palpite nos seus excelentes artigos. Penso que o a obra literária do autor Paulo Rangel "Assassinato na Floresta" tem como enredo principal esse que o senhor acaba de apontar nesse fabuloso texto. Mas penso que ele também apresenta outra vertente, a questão da superação do personagem Ivo Cotoxó, jornalista, injustiçado de forma cruel por seu impiedoso chefe, que insiste em o chamar de "foca", busca da melhor forma fazer a matéria jornalística que a foi passada por seu chefe, como uma forma de se livrar o "foca". Bom, achei que fosse interressante esta colocação. Já vou me desculpando se por ventura atrapalho, mas saibam que foi com as melhores intenções.
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